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Areia Hostil entrevista Sergio Chaves

Eu_zines01 Areia Hostil entrevista Sergio Chaves

Sergio Augusto Chaves Sobrinho. 21 anos. Nascido e residente em Vera Cruz, interior do estado de SP. Balconista numa farmácia em tempo integral. Mas é nos momentos de folga que Sergio faz o que mais lhe dá prazer: quadrinhos, atuando como roteirista e editor. Sergio edita dois fanzines: Justiça Eterna (desde janeiro de 1999) e Universo Subterrâneo (desde junho de 2003). Viu o seu Justiça Eterna ser recentemente premiado como “O Melhor Fanzine de 2005” no site da Michelle Ramos, o Zine Brasil. E olha que ele estava concorrendo com feras do calibre de Edição Quadrinhos, Cabal e Areia Hostil. E o mês de agosto marca a estréia de seu mais novo projeto: Efeito Dominó, ao lado de Anderson Cossa.

Enfim, Sergio Chaves é um sujeito excepcional, simples e humilde que faz amizade facilmente. E por isso mesmo, aliado a seu imenso potencial e talento, é muito respeitado por todos no meio.

E nós da Areia Hostil, não poderíamos perder a chance de entrevistá-lo.


Areia Hostil: O que o levou a mudar o estilo do Justiça Eterna, em 2001 – que até então falava apenas de quadrinhos americanos – e entrevistar um ícone do quadrinho brasileiro, Julio Shimamoto?

Sergio Chaves: A mudança não ocorreu drasticamente. Aos poucos, fomos conhecendo e divulgando algo dos quadrinhos nacionais. A partir de nossa 9ª edição, com a presença do mestre Shimamoto, a repercussão do zine foi outra, saímos da mesmice sobre “super-heróis/quadrinhos americanos” para algo mais além, ou seja, a valorização dos trabalhos de nossa terra.

Hoje, não me privaria em publicar alguma matéria sobre trabalhos e artistas estrangeiros, mas não vejo mais pra quê ficar “repetindo” divulgações já abitoladas em diversos sites e revistas.

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AH: Julio Shimamoto; Alcíone; Flávio Colin; Laudo Ferreira Jr; Edu Manzano; Watson Portela; Mozart Couto; Emir Ribeiro; Lorde Lobo; Clodoaldo Cruz. Só gente boa!!! Bem, não vou perguntar de qual destes artistas você gostou mais ou menos de entrevistar, mas sim, qual você ainda almeja. E por quê?

SC: É, se a pergunta fosse essa, não teria resposta alguma, na verdade. Cada entrevistado tem sua importância, com sua experiência e visão de vida. Todos são sempre muito importantes.

Não almejo nenhum específico, para ser sincero. O que almejamos, sempre, é obter opiniões concretas, interessantes e que possam de alguma forma consolidar a história de nossos quadrinhos – algo nunca valorizado por aqui. Procuro estar entrevistando os mais diversos artistas, que realmente se empenham, produzindo e/ou lutando pelo nosso HQ.

Em nossa próxima edição, nº 20 (provavelmente para agosto/2006), entrevistaremos o roteirista Gian Danton, experiente e destacável quadrinhista de nossa terra – e que, aposto, a maioria de nossos leitores desconhecem, infelizmente.

Universo-Subterraneo Areia Hostil entrevista Sergio Chaves

SC: Começamos a publicar algumas pequenas HQs no J.E. em 2001, mas o espaço era muito escasso, e a demanda, grande. O fanzine Universo Subterrâneo surgiu com o propósito de complementar a atuação doJ.E., publicando e divulgando toda e qualquer atividade do meio independente, seja histórias em quadrinhos (HQs), contos, ilustrações, etc. Estou com planos de ampliar o conteúdo do zine, incluindo resenhas de trabalhos alternativos também, não necessariamente de quadrinhos. No J.E. também há pequenas HQs publicadas, mas a essência da publicação é entrevistas e matérias sobre o meio quadrinhístico, sem dúvida.

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Na verdade, atualmente não chegam muitos materiais – e dos que chegam, poucos se encaixam nas propostas de nossas publicações. Há muitos que enviam materiais para publicação sem me consultar e/ou conhecer a proposta do nosso trabalho (às vezes, recebo a colaboração sem qualquer diálogo de seu autor). Hoje em dia, aceitamos colaborações, mas procuro ser mais seletivo para publicá-las.

AH: Falando de seu mais novo projeto: Efeito Dominó, do que se trata a série?

Efeito-Domino Areia Hostil entrevista Sergio Chaves

SC: Trata-se de pequenas histórias, sobre o dia-a-dia, que serão interligadas sempre por algo em comum, nem sempre sendo seqüências, mas, sim, conseqüências de uma a outra.

Na primeira HQ teremos a arte do amigo Anderson Cossa ( http://fotolog.terra.com.br/andersoncossa ), já muito bem conhecido pelos leitores daqui e do fanzine Universo Subterrâneo. A segunda HQ, sendo que o novo fanzine está previsto de ser bimestral, teremos os traços da artista Bruna McDowell ( http://www.flogao.com.br/bruna1985 ). A terceira já está em fase de produção, a as demais estão para serem trabalhadas, à medida que as primeiras forem publicadas.

AH: E como está sendo trabalhar com Anderson Cossa?

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SC: Até o momento, tive a oportunidade de trabalhar com o Cossa apenas na primeira HQ da série Efeito Dominó, denominada “Amor Funesto”. Espero poder trabalhar com ele em breve, pois o andamento do trabalho, trocas de idéias e resultado de nosso trabalho conjunto foi 100% satisfatório.

AH: Mas Efeito Dominó não é o seu primeiro roteiro, certo?

SC: Não, na verdade, meu primeiro trabalho chama-se “Aleivosia”, ainda em fase de produção com o artista Alcíone (http://alcione.arte.nom.br). Ainda fora esse e as da série Efeito Dominó, iniciei novos projetos, inclusive com amigos daqui de Marília/Sp, mas ainda em andamento. Provavelmente, nas próximas edições do Universo Subterrâneo já teremos novidades.

AH: Pode nos adiantar um pouco a respeito de Aleivosia?

SC: Será uma HQ de nove páginas, e a história fala de uma jovem que acaba de se mudar de estado para dividir uma casa com amigas de faculdade – e ela vê numa festa a oportunidade de se entrosar com o pessoal. Talvez apenas uma história fechada – apesar de eu já ter trajetórias traçadas para as personagens – mas tudo dependerá do resultado final da HQ.

AH: Quais são seus quadrinhistas preferidos?

SC: Há muitos quadrinhistas que admiro. A lista seria extensa, e nesse tipo de classificação sempre ficam muitos (bons) nomes de fora. Gosto de gêneros variados, e para cada qual há os que se destacam. Flávio Colin; Júlio Shimamoto; Terry Moore; Watson Portela; Shiko; Jaime Martin; os irmãos Hernandez; Adrian Tomine; Daniel Clowes; Laudo Ferreira Jr; Allan Ledo; o pessoal do grupo cearense “Os Impossíveis”; Jean Okada; Gabriel Ba; Fábio Moon; LOR; Art Spiegelman; Will Eisner; Jô Oliveira; Jeph Loeb; Joe Sacco; Kevin Smith; André Diniz; Wellington Srbek; DW; Cedraz; Antônio Eder; Eder S. Rodrigues; Romahs… Isso sem contar alguns “medalhões” excessivamente cultuados pela mídia. Muitos destes, aliás, possuem trabalhos no site Nona Arte ( www.nonaarte.com.br ). E vale lembrar que há muitos que desenham “bonito”, mas poucos são capazes de produzir trabalhos destacáveis em arte seqüencial.

AH: E fanzines? Obviamente, você lê muito, não? Pode indicar alguns preferidos?

SC: Realmente, acompanho um bom número de fanzines. Apesar de poucos trazerem trabalhos diferenciados, há muitas boas edições circulando atualmente, e seria difícil e injusto citar algum.

AH: Você é um cara religioso, Sergio? Acredita em quê?

SC: Hmm… Religião e política são assuntos complicados, não? Não acredito que há alguma religião 100% coerente com o que se prega. Tenho minha crença, mas não sigo nenhuma religião específica.

AH: Gostaria de pedir sua opinião a respeito…

………………………………………………………….do PT:

SC: Um partido de boas intenções teóricas, mas pouquíssimas práticas. Decepcionou a todos.

………………………………………………………….do Presidente Lula:

SC: Deixou muito a desejar.

………………………………………………………….do candidato à Presidência, Geraldo Alckmin:

SC: Inclusive com ele, ainda não temos nenhuma boa opção para em quem votar.

………………………………………………………….da atual música nacional – e se você vê algum expoente:

SC: Meu gosto pessoal foge dos padrões populares, mas são lamentáveis as atuais que rolam nas rádios. Muita alienação, com músicas e músicos medíocres obtendo um grande destaque da mídia. O maior problema é termos crianças que ouvem essas porcarias…

………………………………………………………….da atual política cultural do país:

SC: Melhorando, mas ainda muito lenta e pouco abrangente. Muita burocracia, que dificulta e até mesmo impede muitas obras e artistas promissores…

………………………………………………………….do novo filme do homem de aço, Superman – O Retorno:

SC: Não li quase nada a respeito. Pretendo assistir, mas já não espero nada de surpreendente nessas adaptações.

………………………………………………………….das oficinas de roteiros audiovisuais:

SC: Muito importante para geração de profissionais na área. Inclusive para a área quadrinhística, onde podemos muito bem adaptar todo o aprendizado dessas oficinas para os HQs e também ampliar os nossos conhecimentos no quesito “contar uma história”. No meu caso, as Oficinas de Roteiros Audiovisuais – pelas “Oficinas Tarsila do Amaral”, em Marília / SP, com o professor Gilberto Motta – me ajudaram a elaborar melhor minhas idéias para roteiros em quadrinhos, me ensinando a estruturar minhas idéias sem prejudicar o processo criativo.

………………………………………………………….do mercado de quadrinhos brasileiro:

SC: O maior problema, a meu ver, está na distribuição e divulgação. Artistas talentosos e persistentes nós temos (leia-se roteiristas, desenhistas, arte-finalistas, letristas, todos envolvidos no processo de criação de uma HQ). Os que têm possibilidade, até se aventuram em bancar as próprias edições, mas a falta de distribuição se torna algo frustrante. As grandes distribuidoras boicotam as menores, e geralmente as edições nacionais têm uma distribuição restrita – via Correios – e/ou pouco abrangente, o que encarece um pouco mais para o público-leitor interessado. Mas acredito que com a determinação associada ao talento de nossos quadrinhistas, somos capazes de criarmos espaço para nossos trabalhos por aqui.

………………………………………………………….de prêmios, como HQ Mix, Ângelo Agostini, entre outros:

SC: São muito importantes, mas não são tão abrangentes quanto às diversidades de obras que temos em nosso país. O “Ângelo Agostini”, aliás, vêm premiando o fanzine “QI” (do batalhador Edgard Guimarães) há anos, amputando as possibilidades de premiação às outras publicações – incontáveis pelo Brasil afora. Não quero tirar o mérito da publicação do Edgard (pelo contrário!), mas é sabido que o “QI” ´é um dos alicerces da divulgação alternativa no Brasil – portanto, algo injusto premia-lo na categoria após tantos anos. A partir do momento em que novos trabalhos forem destacados, a qualidade dos fanzines atuais se elevará, incentivados com a real possibilidade de um destaque como essas premiações.

AH: Que conselho você daria a alguém que sonha produzir seu próprio fanzine?

SC: Produza. Nos fanzines, temos a oportunidade de publicarmos qualquer coisa, temos uma livre escolha do que e como fazermos algo, mas produza algo que realmente vale a pena pra você. Os fanzines são grandes formas de expormos o nosso trabalho à apreciação. Nele, temos uma infindável forma de evoluirmos, basta estar disposto para isso. Leia, escreva, desenhe, produza. Mas esteja preparado para obter críticas – é só com elas que realmente faz o trabalho valer a pena.

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AH: É verdade que seus zines chegam até à Europa? Como funciona esse negócio?

SC: Na verdade, foi algo bem simples. Com toda essa divulgação que temos dos amigos no meio independente, nosso trabalho atingiu interesses de leitores de fora do Brasil, sim, mas, no momento mantemos alguns poucos leitores espalhados no exterior, devido às diferenças de idiomas. Recentemente, recebemos até mesmo propostas palpáveis de venda em Portugal, mas nada definido ainda.

AH: Bem, Sergio, gostaríamos de agradecê-lo por essa entrevista e, bom, caso queira deixar algum recado para os fãs, o espaço é seu.

SC: Sou eu que agradeço por esta grande oportunidade, claro. Quero agradecer aqui também a todos que vêm nos ajudando sempre, seja com divulgações, críticas, materiais para publicação, etc. Toda divulgação é sempre vital. E é essa atitude que mais importa no meio independente: cumplicidade. Se os resultados do nosso trabalho vêm se aprimorando e melhorando cada vez mais, são graças às críticas sinceras e/ou sugestões que viemos obtendo, livre de preconceitos e puxa-saquismos desnecessários. Os fanzines não precisam ser sempre de menor qualidade que publicações de banca – hoje em dia, aliás, considero o meio independente muito mais interessante e atrativo do que as produções que encontramos em bancas. O objetivo da produção cultural é que cresçamos como indivíduos, e isso só é possível se nos desafiarmos. Em todo o meu trabalho em si, procuro estar sempre evoluindo, tanto eu quanto ao próprio fanzine.. Estamos em fase de mutação, e espero poder continuar assim sempre – nunca estagnar.

Um grande abraço a todos.

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