Areia Hostil entrevista

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Vagner Francisco

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Por Lorde Lobo (28/09/04).

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Areia Hostil - Fala um pouco de ti. Quem é o Vagner, o que ele faz na vida, quando nasceu, onde mora...

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Vagner Francisco - Bom, moro em Cambé/PR, desde de que nasci, há 28 anos. Sou casado. Oficialmente, trabalho numa Agência de Correios Franqueada em Londrina, a 15km de minha cidade. Extra-oficialmente, e por paixão, gasto toda energia que me resta lendo e/ou produzindo quadrinhos - tirando minhas 'responsabilidades' de marido, que aqui, é claro, não contam.

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AH - Como foi o início do teu envolvimento com as HQs?

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VF - O início como leitor? Bom, venho de uma família de leitores e fãs de personagens de quadrinhos. Minha mãe e meu tio quando crianças, iam ao cinema, aos domingos, assistirem aos filmes do Super-Homem. A cada domingo era um episódio diferente. Esse mesmo tio nunca dispensou uma revista em quadrinhos, em suas viagens de longa distância, além de ser um grande fã do marinheiro Popeye. Então, a entrada dos chamados 'gibis' em minha casa, aconteceu de forma natural. Porém, o único que continuou lendo até hoje, sou eu. A primeira revista que li foi uma edição do Capitão América (Editora Abril) em que na capa há a questão: "O que aconteceria se o Capitão América não tivesse sido congelado?". A partir dali, virei um grande fã de super-heróis, principalmente do Capitão. Naquela época eu não enxergava esse tipo de "americanismo exagerado" que os EUA adoram pregar.

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AH - O que costumavas ler e o que tens lido agora?

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VF - Sempre fui Marvete. Sempre gostei de ler quadrinhos de super-heróis, principalmente Capitão América e Heróis da TV.  Quando era mais novo, só lia isso. Hoje, já não leio apenas super-heróis, embora ainda goste muito. Ultimamente, as boas hqs estão compiladas em livros caros e de difícil acesso, como é o caso de Avenida Dropsie, de Will Eisner. Ainda há a sequência de Liga Extraordinária, de Alan Moore e Kevin O'Neil, sendo vendida a cinquentão (R$ 50,00)!!!  É difícil ter dinheiro para comprar tudo, por isso acabo indo com calma. Minha mini-série Do Inferno ainda está incompleta...

Geralmente, acabo buscando opções de boa hq e preço acessível. Acho que uma revista que se destaca nas bancas é Marvel MAX, pois contém uma temática mais madura e um preço relativamente baixo. O mix é muito bom e todos os artistas ali envolvidos têm qualidades. Também acompanho a fase dos X-Men, escrita pelo genial Grant Morrison. Adquiri recentemente Fritz, the Cat, de Robert Crumb e não me arrependi nem um pouco.

 

AH - E entre estes títulos citados, o que mais serviu de influência pro teu trabalho?

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VF - No início, acredito que minha maior influência tenha sido um cara chamado John Byrne. Eu gostava demais do estilo dele, tanto em Vingadores, como na revista do Capitão. Acho que foi ele quem mais me influenciou na hora de 'escrever e desenhar' uma história. Hoje, infelizmente, vejo o trabalho de Byrne e só encontro uma palavra para descrevê-lo: decadência! Atualmente, sempre que tento criar algo, o nome Alan Moore me vem à mente. Seja com Watchmen, V de Vingança, Do Inferno ou Liga Extraordinária, tudo o que ele faz, me deixa empolgado. Outra referência indispensável é Will Eisner. Tenho a edição O Edifício, que a Editora Abril publicou há uns 20 anos. O material continua sendo de primeira qualidade.

 

AH - E quais os artistas - desenhistas ou roteiristas - que mais admiras?

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VF - Atualmente? Roteiristas: precisa responder? Alan Moore, sempre! O cara é genial e eu nem preciso dizer isso. Todos sabem. Estou gostando muito do material do já citado Grant Morrison; J Michael Straczynski também está merecendo elogios rasgados pelo seu trabalho em Poder Supremo (que atualmente está sendo publicado na revista Marvel MAX) e Mark Millar por uma visão, digamos, arrojada dos Vingadores em Os Supremos (material publicado na revista Marvel Millenium: Homem-Aranha). E para finalizar, um brasileiro: Wellington Srbek! Escreve muito bem. Li há algum seu mais recente álbum, Apócripha e o recomendo a todos os apreciadores de um ótimo quadrinho. Pra mim, o que resta ao Wellington para se tornar nacionalmente conhecido por seu talento é uma entrevista na Wizard. Acontecendo isso, ele tem tudo para ser tão famoso quanto Lourenço Mutarelli, Marcelo Cassaro e os gêmeos Gabriel Bá e Fábio Moon.

Desenhistas: Brian Hitch, Frank Quitely, Gary Frank e John Romita Jr. Na minha opinião, são os melhores. Brasileiros: os já conhecidos do grande público, que eu admiro, são: o grande Mozart Couto, Deodato Borges Filho (ou Mike Deodato Jr.) e Renato Guedes, que aliás, é meu amigo! Já aqueles que eu acredito que podem se tornar os novos 'astros' são: Jeremias Raapack, Felipe Watanabe, Anderson Nascimento, André & Adriano - do FX Studios -  e o Toni Francis, que inclusive está desenhando, pra mim, a atual fase do Val, na Areia Hostil impressa.

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Frank & Walter

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AH - Quando foi que resolvestes desenvolver teus próprios personagens?

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VF - Lá pelos idos de 1990. Eu já desenhava, mas nada extenso; apenas desenho livre. Então quando mudei de escola, para estudar mais perto de casa, conheci uma turma muito, mas muito maluca, onde me meti em muitas confusões. Então, percebi que aquelas aventuras poderiam ser transportadas para os quadrinhos tranqüilamente. E as transportei numa 'espécie' de fanzine chamado Turma da Pesada. Um dos ilustres personagens era Anderson Cossa, velho amigo, criador do Rui, o "Protetor Cósmico", e também colaborador da Areia Hostil.

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Os F.E.D.E.R.A.L. 

No ano seguinte, me juntei a um colega de classe (chamado Ricardo de Freitas) para a produção de uma versão "2.0" da Turma. Dessa vez, chegamos a ganhar uma matéria num jornal da cidade.

A partir dali, volta e meia, o Anderson Cossa (que passou a se tornar meu parceiro de criações quadrinhísticas) e eu criávamos personagens e sagas. Uma delas é Frank & Walter (uma das aventuras deles pode ser vista aqui mesmo, no site). 

Outra se chama Os F.E.D.E.R.A.L., super-heróis (ou candidatos a) em aventuras muito loucas.

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AH - Como a maioria dos quadrinhistas brasileiros que estão começando, jogas em todas as "posições", já que crias, escreves, desenhas e arte-finalizas. Mas o que te dá mais prazer?

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VF - Ahh, com certeza é a criação. Sinto prazer em criar histórias, sagas e diálogos. Mas botar isso no papel, ilustrando? Não consigo; fico deprimido, pois olho para o meu desenho e só encontro erros. Então, prefiro criar histórias e passá-las para quem realmente sabe desenhar, como o próprio Anderson Cossa por muito tempo e Toni Francis agora, com o Val, entre outros.

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AH - De que forma tu vês os fanzines?

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VF - Sei que não inovarei em nada ao dizer que os fanzines são uma necessidade para os aspirantes a roteiristas/desenhistas e um refúgio para aqueles quadrinhistas que não conseguem uma merecedora chance de ver seus títulos em bancas sob o selo de alguma editora. Mas é a mais pura verdade! Acho que esse é o papel do fanzine.

Porém, também prefiro pensar que não adianta você criar um fanzine e ficar só nisso. Acredito que o progresso sempre faz bem! Acredito que fanzines de qualidade, como a Areia Hostil e o Manicomics, por exemplo, sempre serão bem-vindos, pois eles estão sempre em constante evolução. 

Areia Hostil, por exemplo, sempre tem suas páginas abrilhantadas por muita gente talentosa, como Raí - o criador do hilário Galo Costa, que conhecemos através do extinto selo Graphic Talents, da Editora Escala - e o vencedor do HQMix, de melhor revista de humor, Orlandeli, com seu Grump - também oriundo do Graphic Talents, além de o já constante estudioso da ficção científica e criador do elogiado álbum BioCyberDrama, ao lado de ninguém menos que Mozart Couto, que - juntamente com Júlio Shimamoto, entre outros - sempre foi fã do tema, Edgar Franco. Isso porque estou citando apenas os mais conhecidos do público em geral.

E o Manicomics, cuja qualidade inegável de seus criadores/editores e colaboradores, fora premiada com um HQMix de melhor fanzine, deixou seus editores bastante animados quando se viram obrigados a rodar uma 2ª impressão de sua edição #23, porque a 1ª não deu nem pro 'cheiro', graças à estréia do talentoso Jean Okada, e muita gente estava interessada em conferí-la. Essa é a mágica do fanzine, creio. 

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Val, no traço do seu criador,

num estudo para a capa da

 Areia Hostil # 9.

AH - Falando nisso, quem acompanha o teu trabalho nas páginas da Areia Hostil impressa - desde quando estreastes na edição número 5 - já se tornou fã do Val. Fala mais sobre este personagem.

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VF - Fã? O Val tem fãs? Eh, eh. Falando sério, agora. Bom, o Val é um desses muitos fãs de quadrinhos - Alan Moore, em especial - e discute com qualquer um que diz que "quadrinho é coisa de criança, de vagabundo; quadrinho é 'gibi'", essas coisas. Eu o criei em 2001, para ser um personagem fixo de um fanzine que seria lançado para divulgar a Gibiteca de Londrina, com a qual tanto o Anderson, quanto eu, estávamos envolvidos. Mas o fanzine nunca saiu do planejamento e a história acabou parando na minha gaveta... até a quinta edição de Areia Hostil.

É claro que a alma do personagem reflete em muito na minha, onde posso brincar com minha maneira 'ácida' de ser. Às vezes, sou irônico e cínico demais; mau-humorado demais. Então acabo canalizando tudo isso no Val.

E embora tenha ambicionado várias sagas para o personagem, só pude realmente realizá-las (algumas) graças ao convite que você, Lorde Lobo, e o Law Tissot me fizeram para participar da Areia Hostil, e lhes sou muito grato por isso. A partir dali, pude ver o Val progredindo. E espero vê-lo crescendo cada vez mais. Tenho muitas idéias para ele e espero poder trabalhar todas elas.

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AH - Além do Val, sei que tens muitos outros personagens e histórias pra oferecer aos leitores. Resumidamente, quem são e do que tratam?

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VF - Bem, alguns eu até já citei: Frank & Walter, criação em conjunto com Anderson Cossa, que narra a aventura de dois jovens comuns ao descobrirem que são a única salvação do universo. É uma saga ambiciosa e muito complicada. Temos a história bolada há 10 anos e não conseguimos sequer imaginar quando a veremos nas bancas.  Os F.E.D.E.R.A.L. são os candidatos a protetores mais atrapalhados do Brasil. Temos uma hq de aproximadamente 25 páginas pronta. Estamos negociando para tentar publicá-la num certo fanzine. Vamos ver... Há uma hq one-shot, sob o título Ignição!, juntamente com Jeremias Raapack. Tenho a história na cabeça, desde 2000, e acho que muito em breve, ela virá à luz. Como o próprio Jeremias gosta de dizer, pretendemos entregar aos leitores "A" história. É um tanto presunçoso de nossa parte, mas esperamos cumprir nossa promessa à risca!

Além destes, estou produzindo, com Toni Francis uma saga chamada MendaX. Estou negociando com alguns veículos que publicam quadrinhos, mas nada ainda está definido, até porque o Toni está no início da produção. É claro, também,  que uma edição especial do Val sempre está em meus planos. Há outras boas novidades vindo por aí, mas não posso adiantar nada ainda, porque há muita coisa indefinida. Quem sabe numa próxima entrevista, heh?

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Victor (ilustração de Toni Francis) é um homem tentando esquecer o próprio passado em "MendaX".

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AH - Quais teus planos futuros?

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VF - Trabalhar mais com quadrinhos; publicar muito mais quadrinhos; continuar trabalhando sempre com bons (em todo sentido da palavra) desenhistas e - quem sabe? - viver de quadrinhos.

 

AH - Gostarias de deixar algum recado pros nossos leitores?

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VF - Continuem com a gente. Tenho certeza que vocês não vão se decepcionar. Olha, esses caras sempre lutaram muito para produzir o melhor fanzine do Brasil; e de certa forma, eles estão conseguindo. Porém, é claro, todos estamos aprendendo muito com tudo isso. Sempre estaremos aprendendo. E a melhor pessoa que pode dizer se estamos no caminho certo ou não, são vocês, leitores. Vocês são nossa bússola! Sempre serão. Por isso, nunca se esqueçam de nos deixar sua opinião. Ela faz parte de nossas vidas. É isso. Obrigado! Deus abençoe a todos!